domingo, 23 de março de 2008

São João, 20

Fonte

No primeiro dia que se seguia ao sábado, Maria Madalena foi ao sepulcro, de manhã cedo, quando ainda estava escuro. Viu a pedra removida do sepulcro.
2. Correu e foi dizer a Simão Pedro e ao outro discípulo a quem Jesus amava: Tiraram o Senhor do sepulcro, e não sabemos onde o puseram!
3. Saiu então Pedro com aquele outro discípulo, e foram ao sepulcro.
4. Corriam juntos, mas aquele outro discípulo correu mais depressa do que Pedro e chegou primeiro ao sepulcro.
5. Inclinou-se e viu ali os panos no chão, mas não entrou.
6. Chegou Simão Pedro que o seguia, entrou no sepulcro e viu os panos postos no chão.
7. Viu também o sudário que estivera sobre a cabeça de Jesus. Não estava, porém, com os panos, mas enrolado num lugar à parte.
8. Então entrou também o discípulo que havia chegado primeiro ao sepulcro. Viu e creu.
9. Em verdade, ainda não haviam entendido a Escritura, segundo a qual Jesus devia ressuscitar dentre os mortos.
10. Os discípulos, então, voltaram para as suas casas.
11. Entretanto, Maria se conservava do lado de fora perto do sepulcro e chorava. Chorando, inclinou-se para olhar dentro do sepulcro.
12. Viu dois anjos vestidos de branco, sentados onde estivera o corpo de Jesus, um à cabeceira e outro aos pés.
13. Eles lhe perguntaram: Mulher, por que choras? Ela respondeu: Porque levaram o meu Senhor, e não sei onde o puseram.
14. Ditas estas palavras, voltou-se para trás e viu Jesus em pé, mas não o reconheceu.
15. Perguntou-lhe Jesus: Mulher, por que choras? Quem procuras? Supondo ela que fosse o jardineiro, respondeu: Senhor, se tu o tiraste, dize-me onde o puseste e eu o irei buscar.
16. Disse-lhe Jesus: Maria! Voltando-se ela, exclamou em hebraico: Rabôni! (que quer dizer Mestre).
17. Disse-lhe Jesus: Não me retenhas, porque ainda não subi a meu Pai, mas vai a meus irmãos e dize-lhes: Subo para meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus.
18. Maria Madalena correu para anunciar aos discípulos que ela tinha visto o Senhor e contou o que ele lhe tinha falado.
19. Na tarde do mesmo dia, que era o primeiro da semana, os discípulos tinham fechado as portas do lugar onde se achavam, por medo dos judeus. Jesus veio e pôs-se no meio deles. Disse-lhes ele: A paz esteja convosco!
20. Dito isso, mostrou-lhes as mãos e o lado. Os discípulos alegraram-se ao ver o Senhor.
21. Disse-lhes outra vez: A paz esteja convosco! Como o Pai me enviou, assim também eu vos envio a vós.
22. Depois dessas palavras, soprou sobre eles dizendo-lhes: Recebei o Espírito Santo.
23. Àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados; àqueles a quem os retiverdes, ser-lhes-ão retidos.
24. Tomé, um dos Doze, chamado Dídimo, não estava com eles quando veio Jesus.
25. Os outros discípulos disseram-lhe: Vimos o Senhor. Mas ele replicou-lhes: Se não vir nas suas mãos o sinal dos pregos, e não puser o meu dedo no lugar dos pregos, e não introduzir a minha mão no seu lado, não acreditarei!
26. Oito dias depois, estavam os seus discípulos outra vez no mesmo lugar e Tomé com eles. Estando trancadas as portas, veio Jesus, pôs-se no meio deles e disse: A paz esteja convosco!
27. Depois disse a Tomé: Introduz aqui o teu dedo, e vê as minhas mãos. Põe a tua mão no meu lado. Não sejas incrédulo, mas homem de fé.
28. Respondeu-lhe Tomé: Meu Senhor e meu Deus!
29. Disse-lhe Jesus: Creste, porque me viste. Felizes aqueles que crêem sem ter visto!
30. Fez Jesus, na presença dos seus discípulos, ainda muitos outros milagres que não estão escritos neste livro.
31. Mas estes foram escritos, para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais a vida em seu nome.

Exsultet

Inglês



Latim



Exultet iam angelica turba caelorum:
exultent divina mysteria:
et pro tanti Regis victoria tuba insonet salutaris.


Gaudeat et tellus tantis irradiata fulgoribus:
et, aeterni Regis splendore illustrata,
totius orbis se sentiat amisisse caliginem.


Laetetur et mater Ecclesia,
tanti luminis adornata fulgoribus:
et magnis populorum vocibus haec aula resultet.


Quapropter astantes vos, fratres carissimi,
ad tam miram huius sancti luminis claritatem,
una mecum, quaeso,
Dei omnipotentis misericordiam invocate.
Ut, qui me non meis meritis
intra Levitarum numerum dignatus est aggregare,
luminis sui claritatem infundens,
cerei huius laudem implere perficiat.

Vers.
Dominus vobiscum.
Resp.
Et cum spiritu tuo.
Vers. Sursum corda.
Resp. Habemus ad Dominum.
Vers. Gratias agamus Domino Deo nostro.
Resp. Dignum et iustum est.

Vere dignum et iustum est,
invisibilem Deum Patrem omnipotentem
Filiumque eius unigenitum,
Dominum nostrum Iesum Christum,
toto cordis ac mentis affectu et vocis ministerio personare.

Qui pro nobis aeterno Patri Adae debitum solvit,
et veteris piaculi cautionem pio cruore detersit.

Haec sunt enim festa paschalia,
in quibus verus ille Agnus occiditur,
cuius sanguine postes fidelium consecrantur.

Haec nox est,
in qua primum patres nostros, filios Israel
eductos de Aegypto,
Mare Rubrum sicco vestigio transire fecisti.

Haec igitur nox est,
quae peccatorum tenebras columnae illuminatione purgavit.

Haec nox est,
quae hodie per universum mundum in Christo credentes,
a vitiis saeculi et caligine peccatorum segregatos,
reddit gratiae, sociat sanctitati.

Haec nox est,
in qua, destructis vinculis mortis,
Christus ab inferis victor ascendit.

Nihil enim nobis nasci profuit,
nisi redimi profuisset.
O mira circa nos tuae pietatis dignatio!
O inaestimabilis dilectio caritatis:
ut servum redimeres, Filium tradidisti!

O certe necessarium Adae peccatum,
quod Christi morte deletum est!
O felix culpa,
quae talem ac tantum meruit habere Redemptorem!

O vere beata nox,
quae sola meruit scire tempus et horam,
in qua Christus ab inferis resurrexit!

Haec nox est, de qua scriptum est:
Et nox sicut dies illuminabitur:
et nox illuminatio mea in deliciis meis.

Huius igitur sanctificatio noctis fugat scelera, culpas lavat:
et reddit innocentiam lapsis
et maestis laetitiam.
Fugat odia, concordiam parat
et curvat imperia.

O vere beata nox,
in qua terrenis caelestia, humanis divina iunguntur!¹

In huius igitur noctis gratia, suscipe, sancte Pater,
laudis huius sacrificium vespertinum,
quod tibi in hac cerei oblatione sollemni,
per ministrorum manus
de operibus apum, sacrosancta reddit Ecclesia.

Sed iam columnae huius praeconia novimus,
quam in honorem Dei rutilans ignis accendit.
Qui, licet sit divisus in partes,
mutuati tamen luminis detrimenta non novit.

Alitur enim liquantibus ceris,
quas in substantiam pretiosae huius lampadis
apis mater eduxit.²

Oramus ergo te, Domine,
ut cereus iste in honorem tui nominis consecratus,
ad noctis huius caliginem destruendam,
indeficiens perseveret.
Et in odorem suavitatis acceptus,
supernis luminaribus misceatur.

Flammas eius lucifer matutinus inveniat:
Ille, inquam, lucifer, qui nescit occasum:
Christus Filius tuus,
qui, regressus ab inferis, humano generi serenus illuxit,
et vivit et regnat in saecula saeculorum.

Resp. Amen.

Dia da Ressureição


De São Gregório Nazianzeno


 


Dia da Ressurreição: um solene princípio!
Acendamos a nossa luz neste dia de festa!
Abracemo-nos uns aos outros!
Voltemo-nos, ó irmãos, mesmo para aqueles que nos odeiam,
não somente a quem, por amor, tenha feito ou sofrido alguma coisa por nós!
Relevemos tudo, por causa da Ressurreição
E perdoemo-nos uns aos outros!
Ontem, eu fui crucificado com Cristo,
Hoje, sou glorificado juntamente com ele!
Ontem, eu morri com ele;
hoje fomos nós dois vivificados!
Ontem eu fui sepultado juntamente com Cristo;
hoje, eu e ele ressurgimos!

Tragamos, portanto, ofertas Àquele que padeceu e ressuscitou por nós!
Pensais vós, talvez, que eu esteja me referindo a ouro ou prata
ou tecidos e pedras reluzentes e preciosas...
Matéria corruptível que provém da terra
e sobre a terra é destinada a permanecer,
além do mais em propriedade de gente malvada
e escrava do mundo e do seu príncipe...

Eu digo, ao invés, que devemos oferecer a Deus totalmente a nós mesmos:
Esta é a oferta que lhe agrada e que convém!
Procuremos ser como Cristo,
já que também Cristo tornou-se um de nós;
Procuremos nos tornar divinos por meio dele,
já que ele mesmo, por nós, tornou-se homem!
Ele tomou o pior sobre si para nos conceder o melhor:
Fez-se pobre para que nós, graças à sua pobreza, nos tornássemos ricos;
Assumiu o aspecto de servo, para que obtivéssemos a liberdade;
Desceu ao mais baixo, para que nós fôssemos elevados ao mais alto;
Sofreu a tentação, para que nós conseguíssemos vencê-la!
Deixou-se desprezar, para nos dar a glória;
Morreu, para trazer-nos a salvação;
Subiu ao céu, para atrair a si aqueles que jazem na terra,
depois de terem caído por causa do pecado.
Cada um, portanto, doe tudo, ofereça tudo em sacrifício
Àquele que nos deu a si mesmo para a nossa redenção!
O maior dom que podemos oferecer-lhe será exatamente
aquele de nos doar-lhe totalmente a nós mesmos,
depois de termos compreendido o significado de tal Mistério
e de nos ter dado conta que tudo ele realizou por nós!

(Fonte)

O primeiro dia de uma vida nova

De São Gregório de Nissa

Eis uma máxima sábia: "No dia da felicidade, esquecemos todos os males" (Eclo 11,25). Hoje foi esquecida a sentença lançada sobre nós, melhor, não foi esquecida, mas anulada! Este dia apagou completamente qualquer lembrança da nossa condenação.

Outrora, o parto passava-se na dor; agora, o nosso nascimento é sem sofrimento. Outrora não éramos senão carne, nascíamos da carne; hoje o que nasce é espírito, nascido do Espírito. Ontem, nascíamos simples filhos dos homens; hoje nascemos filhos de Deus. Ontem, éramos os rejeitados dos céus sobre a terra; hoje, Aquele que reina nos céus faz de nós cidadãos do céu. Ontem a morte reinava por causa do pecado; hoje, graças à Vida, é a justiça quem toma o poder.

Um único homem abriu-nos outrora as portas da morte; hoje, um único homem traz-nos de novo à vida. Ontem, perdemos a vida por causa da morte; mas hoje a Vida destruiu a morte. Ontem, a vergonha fazia-nos esconder debaixo da figueira; hoje, a glória atrai-nos para a árvore de vida. Ontem, a desobediência tinha-nos expulsado do Paraíso; hoje, a nossa fé faz-nos entrar nele. De novo nos é oferecido o fruto da vida para que o saboreemos tanto quanto quisermos. De novo a nascente do Paraíso, cuja água nos irriga pelos quatro rios dos evangelhos (cf Gn 2,10), vem refrescar todo o rosto da Igreja...

Que devemos fazer agora, senão imitar, nos seus saltos jubilosos, as montanhas e as colinas das profecias: "Montanhas, saltai como carneiros; e vós, colinas, como cordeiros!" (Sl 113,4) Vinde, pois, exultemos de alegria no Senhor! (Sl 94,1) Ele quebrou o poder do inimigo e ergueu o grande troféu da cruz... Digamos, pois: "Grande é o Senhor nosso Deus, um grande rei em toda a terra!" (Sl 94,3; 46,3) Ele abençoa o ano coroando-o com os seus benefícios (Sl 64,12) e reúne-nos num coro espiritual, em Jesus Cristo, nosso Senhor, a quem pertence a glória pelos séculos dos séculos. Amém!

(Fonte)

Ressuscitou!

Fonte

Gustavo Corção



Não há em todo o ano litúrgico, que é o vôo circular em que a Igreja contempla amorosamente os mistérios de Cristo, momento mais jubiloso e mais belo em que, antes de acender o Círio Pascal, o Diácono canta o “Exultet Jam Angélica Turba Caelorum...” que é, sem dúvida alguma, o maior primor que os homens, com inspiração divina e engenho próprio jamais lograram compor em toda a história do cristianismo e do mundo. Quem já adulto, e já doloridamente vivido, teve a felicidade de ouvi-lo pela primeira vez no esplendor do Movimento Litúrgico, pôde apreciar, nessa adamantina condensação, todo o apuro, todo o requinte de infinito bom-gosto que a Igreja, ex abundantia operis, trouxe à civilização, e até hoje guarda a lembrança do estremecimento da alegria que nessa noite sentiu como antecipação de todas as promessas de Deus:
O vere beata nox, quae sola meruit scire tempus et horam in qua Christus ab inferis ressurrexit! – Ó bem-aventurada noite, única que mereceu conhecer o dia e a hora em que Cristo ressuscitou dos mortos.


Inebriada de alegria a Igreja delira, e chega à amorosa inconveniência, à desmedida loucura de cantar:
O certe necessarium Adae peccatum... O felix culpa... – Ó necessário pecado de Adão...Ó culpa feliz.

E depois, agora mais senhora de si, gravemente repete a grande história do Verbo de Deus desde a madrugada da Criação, desde a promessa feita a Abraão, e através das palavras dos profetas até aquela outra madrugada do primeiro dia da semana em que Maria Madalena e a outra Maria vieram visitar o sepulcro.
Maria Madalena e Maria, mãe de Tiago e Salomé, haviam comprado aromas para embalsamá-Lo, e pelo caminho diziam: “Quem nos levantará a pedra do sepulcro?
Chegadas, viram a pedra rolada, e então as duas mulheres voltaram correndo para anunciar aos apóstolos o que viram e ouviram do anjo que estava ao lado do sepulcro: Ele ressuscitou!


E daí em diante começaram as páginas mais transluminosas, e mais banhadas de alegria das Sagradas Escrituras. Cada quadro tem uma luz suave e mais penetrante do que todo o alvorecer da Criação.

Agora num relâmpago, vemos Maria Madalena voltar-se para o vulto que julgava ser o do jardineiro, e com ela ouvimos:

- Maria! E logo a resposta de adoração: - Raboni!

Mais adiante é no Cenáculo, onde estavam fechados e tristes os apóstolos, que Jesus ressuscitado aparece e lhes diz: “A paz seja convosco.” E agora é na estrada de Emaús que dois discípulos caminham conversando a respeito de tudo o que havia acontecido, e à certa altura percebem que alguém caminha com eles, e lhes pergunta: “De que falais enquanto caminhais?” Os viandantes ficaram tristes, e o que se chamava Cleofas respondeu ao desconhecido: “Serás tu, forasteiro em Jerusalém, o único a ignorar o que se passou nestes dias?” “O que aconteceu?”, perguntou o desconhecido. E os peregrinos contaram a história de Jesus de Nazaré, profeta poderoso em obras e palavras diante de Deus, que os príncipes dos sacerdotes e magistrados entregaram para ser condenado à morte, e morte de cruz; e disseram que estavam tristes porque esperavam que ele libertasse Israel, e agora já três dias passaram... É verdade que algumas mulheres, que se achavam conosco, dizem que seu corpo desapareceu do sepulcro e que um anjo anunciou que Ele estava vivo! Mas eles ainda duvidavam...

Disse-lhes então o desconhecido: “Ó homens sem inteligência, como tarda vosso coração em crer o que os Profetas anunciaram!” E começando por Moisés, percorrendo todos os Profetas, o desconhecido ia explicando as palavras de Deus à medida que se aproximava de Emaús. O desconhecido deu a entender que tomava outro caminho, mas a pedido dos peregrinos entrou com eles num albergue. “Fica conosco!” pediam os peregrinos, e Jesus, com eles à mesa, tomou o pão, benzeu-o, partiu-o, e deu-lhes, e então seus olhos se abriram, mas Jesus desaparecera.

Esta pequena história que resiste a todos os maltratos da humana grosseria, tem inspirado e animado o engenho de todas as artes humanas, e poderá ainda, até o fim do mundo, ser cantada, contada, pintada e lavrada sem que a infinita profundidade de sua beleza venha a se exaurir. Por mim, neste momento, sinto com especial comoção a beleza da ação de graças dos dois peregrinos quando retomam a caminhar: - “Lembras-te como nosso coração se abrasava quando Ele, no caminho, nos explicava as Escrituras?”

Peçamos nós a esses santos peregrinos que nos obtenham de Deus a mesma graça de sentir arder o coração quando ouvirmos a voz de Cristo na voz da Igreja a nos explicar os formidáveis mistérios da Pátria.

Diz-nos São Paulo na Vigília Pascal: “Se morrermos com Cristo, com Ele ressuscitaremos e viveremos.” Mas nosso tardo coração sente-se amedrontado diante de tão excessiva promessa de Deus.

Na verdade, na verdade, todos os dons de Deus e todas as suas promessas são excessivas, e tamanho clarão de mistério às vezes mais nos ofusca e nos cega do que nos ilumina. “Creio... na ressurreição da carne...” balbucio eu envolvendo este artigo no mesmo global ato de fé que tem sua razão de ser na Palavra de Deus. Balbucio e tremo quando considero esta pobre carne já tão desgastada, “comme um vieux mouton qui a perdu sa laine aux ronces du chemin” – como um velho carneiro que perdeu sua lã nos espinhos do caminho. Como poderá resplender e reflorescer este pobre corpo já tão próximo do desmoronamento total?

Afina teu ouvido, ó tardo coração, e pondera que nesta Vigília Pascal, por sua Igreja, Cristo nos rememora todas as grandezas de Deus desde a criação até esse momento único em que a chama do Círio representa a grande transição, a maravilhosa travessia, a Páscoa que nos transporta de um desastrado mundo para o mundo dos ressuscitados. E pondera bem, alma de minh’alma, que um só ato vivificado pela graça de Cristo é maior do que todas as galáxias; e que as vezes que do pecado saíste por um ato de contrição e pelo perdão sacramental somam maior total de maravilhas do que todo o Universo criado. Na verdade, na verdade tu te deténs demais na excessiva promessa anunciada pelo Exultet porque ainda te agarras demais à idéia de que teu corpo com sua variedade de órgãos e funções, é a maior maravilha de teu ser. No que te enganas demais, alma de minha alma, porque a maior maravilha de meu ser é a graça da adoção, é o favor sobrenatural que Deus nos concede: o de podermos chamá-lo de Pai Nosso...

E nessa ordem de coisas, que importa infinitamente mais do que todas as estrelas do céu, todas as flores da terra e todos os peixes do mar, nessa ordem nova ou nessa nova criação – tudo é graça.

Ressurexit

sábado, 22 de março de 2008

Utilidade da Descida de Cristo aos Infernos

Fonte

De São Tomás de Aquino

Tradução de Dom Odilão Moura

Da descida de Cristo aos infernos podemos tirar quatro ensinamentos para nossa instrução.

1. — Primeiro, uma firme esperança em Deus, pois quando quer que o homem esteja em aflição, deve sempre esperar do auxílio divino e nele confiar. Nada há de mais sério do que cair no inferno. Se portanto Cristo libertou os que estavam nos infernos, cada um, se é de fato amigo de Deus, deve muito confiar para que Ele o liberte de qualquer angústia. Lê-se: "Esta (isto é, a sabedoria) não abandonou o justo que foi vencido (...) desceu com ele na fossa, e na prisão o não abandonou" (Sb 10, 13-14). Como Deus auxilia aos seus servos de um modo todo especial, aquele que O serve deve estar sempre muito seguro. Lê-se: "O que teme ao Senhor por nada trepidará e nada temerá por que Ele é a sua esperança" (Ecl 39, 16).



2. — Segundo, devemos despertar em nós o temor, e de nós afastar a presunção. Pois, apesar de Cristo ter suportado a paixão pelos pecadores, e ter descido aos infernos, não libertou a todos, mas somente àqueles que estavam sem pecado mortal, como acima foi dito. Aqueles que morreram em pecado mortal, deixou-os abandonados. Por isso, ninguém que desça de lá com pecado mortal espere perdão. Mas ficarão no inferno o tempo em que os Santos Patriarcas estiverem no Paraíso, isto é, para toda a eternidade. Lê-se em São Mateus: "Irão os malditos para o suplício eterno, os justos, porém, para o Paraíso" (Mt 25, 46).



3. — Terceiro, devemos viver atentos, porque se Cristo desceu aos infernos para a nossa salvação, também nós devemos com solicitude lá descer em espírito, meditando sobre às penas nele existentes, imitando o Santo Ezequias, que dizia: "Irão os malditos para o suplício eterno, os justos, porém, para o Paraíso" (Is 38, 10).



Desse modo, aquele que em vida vai lá pela meditação, não descerá facilmente para o inferno na morte, porque essa meditação afasta do pecado.



Aos vermos como os homens deste mundo evitam as más ações por temor das penas temporais, como não deveriam eles muito mais se resguardarem do pecado por causa das penas do inferno, que são muito mais longas, mais cruéis e mais numerosas? Eis porque lê-se nas Escrituras: "Lembra-te dos teus últimos dias, e não pecarás para sempre" (Ecl 7, 40).



4. — O quarto ensinamento tirado da descida de Cristo aos infernos, é nos ter Ele oferecido um exemplo de amor. Cristo desceu aos infernos para libertar os seus. Devemos também nós lá descer pela meditação, para auxiliar os nossos. Eles, por si mesmos, nada podem conseguir. Nós é que devemos ir em socorro dos que estão no purgatório. Se alguém não quisesse socorrer um ente querido que estivesse na prisão, como isso nos pareceria cruel! No entanto, seria muito mais cruel aquele que não viesse em socorro do amigo que está no purgatório, pois não há comparação entre as penas deste mundo e aquelas. Lê-se a esse respeito: "Tende piedade de mim, tende piedade de mim, pelo menos vós, ó meus amigos, porque a mão de Deus me socorre" (Jo 19, 21). — "É santo e salutar o pensamento de orar pelos defuntos para que sejam livres dos pecados" (Mc 19, 46).



São auxiliados os que estão no purgatório principalmente por três atos, conforme disse Agostinho: pelas Missas, pelas orações e pelas esmolas. Gregório acrescenta um quarto: o jejum. Não deve causar admiração que assim seja, porque também neste mundo o amigo pode satisfazer pelo amigo. A mesma coisa acontece com os que estão no purgatório.



In Symb.



(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

sexta-feira, 21 de março de 2008

CRUCEM TUAM ADORAMUS



Crucem tuam adoramus, Domine:
sanctam ressurrectionem tuam
laudamus et glorificamus:
ecce enim propter lignum
venit gaudium in universo mundo.

A Morte de Cristo

Fonte

De São Tomás de Aquino

Sexta-feira santa

Foi conveniente que Cristo morresse, pelas seguintes razões:

1. Para consumar a nossa redenção, pois, apesar da Paixão ter virtude infinita por causa da união da divindade, não foi durante um sofrimento qualquer que nossa redenção foi consumada, mas na morte de Cristo. Por isso diz o Espírito Santo pela boca de Caifás (Jo 11, 50): convém que morra um homem pelo povo. E santo Agostinho: Admiremos, congratulemo-nos, rejubilemo-nos, amemos, louvemos e adoremos, pois, pela morte de nosso redentor, fomos chamados das trevas à luz, da morte à vida, do exílio à pátria, do luto à alegria.

2. Para o aumento da fé, da esperança e da caridade.

Quanto ao crescimento da fé, aquilo do salmista: quanto à mim, estou só até que eu passe, i. é, deste mundo ao Pai. Mas, quando tiver passado deste mundo ao Pai, então serei multiplicado. Se o grão de trigo que cai na terra não morre, permanece só.

Quanto ao crescimento da esperança, diz o Apóstolo (8, 32): O que não poupou nem o seu próprio Filho, mas por nós todos o entregou, como não nos dará também com ele todas as coisas? É inegável que dar todas as coisas é ainda menos que entregar Cristo à morte por nós. São Bernardo diz: "Quem não se encherá da esperança de possuir confiança, se considerar a posição do corpo crucificado de Cristo? Sua cabeça inclinada, para dar-nos o ósculo da paz; seus braços estendidos, para nos abraçar; suas mãos traspassadas, para nos cumular de bens; seu coração aberto, para nos amar; seus pés cravados, para permanecer conosco". Lemos nas Escrituras (Ct 2, 14): "Pomba minha, tu que te recolhes nas aberturas da pedra". Nas chagas de Cristo, a Igreja estabeleceu e fez seu ninho, colocando a esperança de sua salvação na Paixão do Senhor; e assim protege-se das surpresas do falcão, i. é, do diabo.

Quanto ao crescimento da caridade, aquilo das Escrituras (Ecle 43, 3): "Ao meio dia queima a terra". Ou seja, no fervor da Paixão, ardem de amor os corações terrestres. Diz ainda são Bernardo: "O cálice que bebestes, ó bom Jesus, mais que tudo, vos fez amável. A obra de nossa redenção reivindica absoluta e prontamente todo nosso amor para si; ela faz agradável a devoção, torna-a mais justa, une-nos mais estreitamente e com maior veemência nos toca o coração."

3. Por causa do sacramento da nossa salvação, para que, pelo exemplo de sua morte, morrêssemos para este mundo. "Por isso a minha alma prefere a suspensão, os meus ossos preferem a morte" (Jó 7, 15). E são Gregório comenta: "A alma é a intenção do espírito, os ossos são a força da carne. O que está suspenso, foi erguido do chão. A alma, portanto, foi erguida às coisas da eternidade, para que morram os ossos, pois o amor da vida eterna destrói em nós toda a força da vida exterior". Ser desprezado pelo mundo é o sinal desta morte. São Gregório acrescenta: "o mar retém os corpos viventes, mas rejeita os cadáveres".

De humanit. Christi


(P. D. Mézard, O. P., Meditationes ex Operibus S. Thomae.)

No limiar da Semana Santa

Fonte


Gustavo Corção



"Ainda uma vez estamos nós, caro leitor, enquanto por aqui andamos, no limiar da Semana das semanas, a Semana Santa, onde a alma antes de se rejubilar com os hinos da Ressurreição, contempla e sofre a Paixão do seu Senhor.


Toda nossa vida cristã, na medida em que é cristã, deveria transcorrer diante do mesmo sistema de referências com eixos em cruz, mas Deus reconhece nossa fraqueza e confiou à sua Igreja uma soma de recursos pedagógicos para reavivar em nós o nosso nome, o nosso compromisso, o nosso fraco amor. O ano litúrgico é um recurso didático, uma espécie de sabatina, mas difere numa coisa dos métodos humanos de recordação e representação. Quando celebramos um aniversário, uma data de nascimento, de feito cívico ou de festa familiar, é só afetiva a nossa rememoração. Os personagens mortos, os dias idos e vividos não reaparecem na festa senão sob as espécies de sinal e de lembrança. Outra coisa, porém, é a recordação de um mistério divino, como esta que constitui agora a Liturgia da Semana Santa: se o Cristo não torna a descer e a se encarnar e não torna a padecer, não é menos verdadeira uma espécie de descida espiritual desta grande semana. Em outras palavras, não somos só nós, Igreja Militante, que celebramos a Semana Santa, é toda a Igreja, são todos os Santos, e acima de tudo o próprio Deus que realiza na Liturgia uma repetição efetiva, real, da Encarnação e da Paixão.


E diante dos textos inesgotáveis, por mínima que seja a atenção, tornamos a notar o duplo aspecto divino-humano, em máxima densidade nos dias da Paixão de Nosso Senhor. Tudo o que aconteceu naquele tempo, que ficou registrado nos Evangelhos, tem a marca de um contraste tremendo que Deus ao mesmo tempo exalta e aplaina. Em nenhum outro ponto do Evangelho é tão evidente a transcendência da obra de Cristo, e a sua divindade; mas também em nenhum outro ponto é tão evidente o caminho percorrido pela Misericórdia até as profundezas de nossa miséria. Na leitura de todo o Evangelho antes destes textos de concentração máxima, aqui e ali, se nota o peso da carne, diria até o leve peso da carne na vida de Jesus. Aqui ele tem fome, acolá diz-se cansado. Aqui freme de cólera diante dos vendilhões do templo ou diante da hipocrisia dos fariseus, e acolá chora diante do amigo morto. Mas nas vésperas da Paixão, já diante da Ceia, a atmosfera de paixões se adensa. No Evangelho de Marcos, a Ceia da Quinta-feira Santa começa logo, quase diria ao levantar-se o pano, com uma conversa dramática: “E quando estavam à mesa e comiam, disse Jesus: - Em verdade vos digo que um de vós, que come comigo, me há de entregar”. E então os discípulos ficaram perturbados e começaram a dizer: “Sou eu?” e começaram a se gabar: “Ainda que todos se escandalizem a Teu respeito, eu não me escandalizarei”. E assim se vê que a festa tranqüila, a refeição de amizade, se carrega de tragédia. E nós sentimos ao mesmo tempo a infinita distância, e a infinita proximidade do Verbo Encarnado em todos os passos da Semana Santa. E se em cada episódio ganha realce a tristeza de nossa miséria, acentua-se também, pelo interesse de Jesus por nós, a nota de nossa dignidade. E assim, quando estivermos inclinados a desanimar de nossa humanidade temos o Cristo Crucificado a nos ensinar do alto da Cruz, “ex-cathedra”, o fundamento de nossa religião, de nossa metafísica, de nossa moral, de nossa política.


Às vezes nos escandalizamos quando vemos dentro da Igreja agitações, perturbações, divisões, parecidas com aquela que existiu e que ganhou singular destaque na Quinta-feira Santa em torno da Ceia. E até pensamos que seja virtude calar, quando alguns dão público espetáculo de seus desatinos, como se pudesse haver alguma vantagem em tornar visível aos olhos do mundo somente este aspecto triste, com o risco de alguns pensarem que os demais aspectos da Igreja são do mesmo quilate. A Liturgia da Semana Santa mostra, por assim dizer, a enorme franqueza com que a Igreja publica, cantando, os estremecimentos, os desentendimentos, as traições. Não se escandalizem, pois, os que descobrem, como se descobrissem a pólvora, que o drama continua, e que é diante do mesmo Cristo Crucificado que nós continuamos a clamar pelos séculos e séculos, movidos por nossa insegurança, por nosso sentimento de culpa, por nosso fraco amor: “Sou eu?”, “Sou eu? Eu não me escandalizarei ...” É claro que nós gostaríamos de ter maior entendimento, sobretudo com os mais próximos; é claro que nós lamentamos, que nós choramos, que nós sonhamos com uma paz e uma unidade aqui mesmo neste vale de lágrimas; é claro, claríssimo, que nem por ser permanente o drama da Paixão, devemos descuidar-nos de lutar por uma concórdia maior dentro da Igreja. Mas a grande lição da Semana Santa é a da confiança total posta no mérito do Cristo e na obra de redenção, da qual se tira um conforto sobrenatural, que não se parece com as fórmulas usuais de conforto que o mundo pode dar. Nossa religião é de Cruz: gloriemo-nos na Cruz de Nosso Senhor."

quarta-feira, 12 de março de 2008

Santo Alexandre




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Patriarca de Alexandria, data de nascimento incerta; morreu em 17 de Abril de 326. Descontada a sua própria grandeza, ele é proeminente pelo fato de sua indicação para a Sé dos Patriarcas ter excluído o heresiarca Ário do posto. Ário começou a ensinar suas heresias no ano 300 quando Pedro, por quem Ário foi excomungado, era Patriarca. Foi reinstalado por Achillas, o sucessor de Pedro, para ser feito Bispo. Quando Achillas morreu, Alexandre foi eleito, e depois disso Ário tirou seu disfarce. Alexandre lhe era particularmente repugnante, embora tenha sido tão tolerante com os primeiros erros de Ário que o clero mais próximo se revoltou. Finalmente, a heresia foi condenada em um Concílio realizado em Alexandria, e mais tarde, com ficou conhecido, no Concílio geral de Nicéia, cujas Atas acredita-se terem sido escritas por Alexandre. Um mérito adicional desse grande homem é que durante seu sacerdócio ele passou por sangrentas perseguições de Galério, Maximinus, e outros. Foi enquanto seu predecessor Pedro estava na prisão, esperando pelo martírio, que ele e Achillas foram bem sucedidos em retomar o pontificado, e intercederam pela reabilitação de Ário, que Pedro recusou inteiramente, declarando que Ário estava condenado à perdição. A recusa evidentemente teve pouco efeito, pois quando Achillas sucedeu Pedro, Ário tinha sido feito padre; quando Alexandre, por sua vez, chegou à Sé, a heresia já era tolerada. Vale recordar que o grande Atanásio sucedeu Alexandre e que o pontífice moribundo compeliu o futuro doutor da Igreja a aceitar o posto. Alexandre é descrito como “um homem tido na mais alta honra pelo povo e o clero, magnificente, liberal, eloqüente, justo, que amava a Deus e ao homem, devoto aos pobres, bom e doce para com todos.” Sua festa é realizada no dia 17 de Abril.

Teófilo de Antioquia



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Bispo de Antioquia (†após 181). O “Ad Autholycum”, o único escrito restante de Teófilo, é uma apologia do Cristianismo. Consiste de três livros, trabalhos efetivamente separados, escritos em diferentes épocas, e corresponde exatamente à descrição dada por Eusébio de “três trabalhos elementares” (Hist. eccl., IV, xxiv). O autor fala de si mesmo como um convertido do paganismo. Trata de assuntos como a idéia cristã de Deus, o relato da Escritura da origem do homem e do mundo comparado aos mitos pagãos. Em algumas ocasiões ele se refere (vinculado aos primeiros capítulos do Gênesis) a um trabalho histórico composto por ele próprio. Eusébio (op. cit.) fala das refutações de Marcião e Hermógenes, e de “livros catequéticos”. A estes São Jerônimo (De vir. illust., xxv) adiciona comentários aos Provérbios e aos Evangelhos. Ele fala dos comentários de Teófilo aos Evangelhos no prólogo de seus próprios comentários, e também de sua epístola “Ad Algasiam”, na qual aprendemos que Teófilo comentou sobre um Diatessaron ou Evangelho da Harmonia composto por ele próprio (“Teophilis... quattor Evangelistarum in unum opus compingens.”). Uma longa citação da mesma epístola é tudo o que resta desse comentário, pois a tentativa de Zahn de identificá-lo com um comentário em Latim atribuído a alguns manuscritos de Teófilo não encontrou partidários.

São Panfílio de Cesaréia

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Martirizado em 309. A Vida de Panfílio, escrita por Eusébio, se perdeu, mas por seu “Mártires da Palestina” aprendemos que Panfílio pertencia a uma nobre família de Beirute (na Fenícia), onde recebeu uma boa educação, e que abandonou sua terra natal após vender todas as suas propriedades e dá-las aos pobres. Ele se uniu aos “homens perfeitos”. De Fótio, que tomou suas informações da “Apologia de Orígenes”, de Panfílio, aprendemos que ele foi pra Alexandria onde seu professor era Piétrio, então o diretor da famosa Escola Catedrática.



Ele finalmente se estabeleceu em Cesaréia onde foi ordenado padre, coligiu sua famosa biblioteca, e estabeleceu a escola para o estudo teológico (Eusébio, “Hist. Eccl.”, VII, xxxii, 25). Devotou-se principalmente a produzir cópias acuradas da Sagrada Escritura. Testemunhos de seu zelo e cuidado em seu trabalho são encontrados nos de manuscritos. São Jerônimo (De Vir. Ill., lxxv) diz que Panfílio “transcreveu a maior parte dos trabalhos de Orígenes de seu próprio punho”, e que “essas transcrições ainda estão preservadas ma biblioteca de Cesaréia.” Ele mesmo era proprietário dos “vinte e cinco volumes dos comentários de Orígenes”, copiados por Panfílio, que ele via como a mais preciosa relíquia do mártir. Eusébio (Hist. Eccl., VI, xxxii) fala do catálogo da biblioteca contido em sua Vida de Panfílio. Uma passagem da Vida, mencionada por São Jerônimo (Adv. Rufin, I, ix) descreve como Panfílio sustentou estudantes pobres em suas necessidades, e não apenas emprestou, mas deu a eles cópias da Escritura, das quais mantinha um imenso suprimento. Da mesma forma, ele concedeu cópias a mulheres devotadas ao estudo. O grande tesouro da biblioteca em Cesaréia era a cópia da Hexapla do punho do próprio Orígenes, provavelmente a única cópia completa que ele fez. Foi consultada por São Jerônimo (“In Psalmos Comm.”, ed. Morin, pp. 5, 21; “In Epist. As Tit.”). A biblioteca certamente existia no sexto século, mas provavelmente não sobreviveu à tomada de Cesaréia pelos Sarracenos em 636 (Swete, “Introd. To O.T. in Greek”, 745).



A perseguição de Diocleciano começou em 303. Em 306 um homem chamado Afiano interrompeu o governador no ato de oferecer sacrifício, e pagou por seu atrevimento com um terrível martírio. Seu irmão Edésio, também um discípulo de Panfílio, sofreu o martírio aproximadamente no mesmo período em Alexandria em circunstâncias similares. A hora de Panfílio chegou em Novembro de 307. Ele foi trazido diante do governador e, ao se recusar a sacrificar, foi cruelmente torturado, e então mandado para a prisão. Lá, ele continuou copiando e corrigindo os manuscritos. Também compôs, em colaboração com Eusébio, uma “Apologia de Orígenes” em cinco volumes (Eusébio, mais tarde, adicionou um sexto). Panfílio e outros membros de sua família , homens “no pleno vigor de mente e corpo”, foram sentenciados, sem mais torturas, a serem decapitados em Fevereirro de 309. Enquanto a sentença era dada, um jovem chamado Porfírio- “o escravo de Panfílio”, “o amado discípulo de Panfílio”, que “foi instruído na literatura e na escrita”-, exigiu os corpos dos confessores para enterro. Ele foi cruelmente torturado e morto, e as notícias de seu martírio foram mandadas a Panfílio antes de sua própria execução.



Da “Apologia de Orígenes” somente o primeiro livro resta, e numa versão latina feita por Rufino. Ela começa descrevendo a amargura extravagante do sentimento contra Orígenes. Ele era um homem de profunda humildade, de grande autoridade na Igreja de seu tempo, e honrado com o sacerdócio. Ele era, acima de tudo, ansioso por manter a regra de fé que veio dos Apóstolos. A ortodoxia de sua doutrina concernente à Trindade e à Encarnação é então justificada por excertos de seus escritos. A seguir, nove acusações contra seus ensinamentos são confrontadas com passagens de suas obras. São Jerônimo escreveu em seu “De Viris Illustribus” que havia duas apologias- uma de Panfílio e outra de Eusébio. Ele descobriu seu erro quando a tradição de Rufino apareceu no auge da controvérsia origenista, e chegou à conclusão de que Eusébio era o único autor. Ele acusou Rufino, entre outras coisas, de pôr sob o nome do mártir o que foi na verdade o trabalho do heterodoxo Eusébio, e de suprimir passagens não-ortodoxas. Para a primeira acusação há evidências abundantes de que a “Apologia” foi um trabalho conjunto de Panfílio e Eusébio. Contra a segunda pode ser mencionado o testemunho negativo de Fótio que leu o original; “Fótio que era severo com o excesso diante da mais leve semelhança de Arianismo, na apologia de Orígenes que ele havia lido em Grego” (Ceillier). Os Cânones do alegado Concílio dos Apóstolos em Antioquia foram atribuídos por seu compilador (do fim do quarto século) a Panfílio (Harnack, “Spread of Christianity”, I, 86-101). A atribuição a Panfílio, por Gemádio, do tratado “Contra Mathematicos” foi devida à má interpretação do prefácio de Rufino à Apologia. Um sumário dos Atos dos Apóstolos, entre outros escritos associados a Eutálio, trazem em sua inscrição o nome de Panfílio (P. G.m, LXXXIX, 619 sqq.).

quinta-feira, 6 de março de 2008

Tratado sobre o Salmo 64

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De Santo Hilário, bispo de Poitiers

«O Templo de que falava era o seu Corpo»

O Senhor disse. "Aqui será o meu repouso para sempre" e "escolheu Sião como lugar de sua morada" (Sl 131,14). Mas Sião e o seu templo foram destruídos. Onde se erguerá então o trono eterno de Deus? Onde será o seu repouso para sempre? Onde será o seu templo para que nele habite? O apóstolo Paulo responde-nos: "O templo de Deus sois vós; em vós habita o Espírito de Deus" (1Cor 3,16). Eis a casa e o templo de Deus; eles estão cheios da sua doutrina e do seu poder. São o habitáculo da santidade do coração de Deus.

Mas esta morada, é Deus quem a edifica. Construída pela mão dos homens, não duraria, nem mesmo se fosse fundada sobre doutrinas humanas. Os nossos vãos labores e as nossas inquietações não bastam para a proteger. O Senhor resolve as coisas de outra maneira; ele não pôs os seus alicerces sobre terra solta nem sobre areias movediças, mas assentou-a sobre os profetas e os apóstolos (Ef 2,20); ela é incessantemente construída com pedras vivas (1Pe 2,5) e desenvolver-se-á até às últimas dimensões do corpo de Cristo. A sua edificação prossegue sem cessar; à sua volta erguem-se numerosas casas que se reúnem numa cidade grande e bem-aventurada (Sl 121,3).

Vem, segue-me

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De Santo Irineu de Lyon

Por ter seguido a Palavra de Deus, o seu apelo, espontânea e livremente na generosidade da sua fé, Abraão tinha-se tornado "o amigo de Deus" (Tg 2,23). Não foi por causa de uma necessidade premente que o Verbo de Deus procurou esta amizade com Abraão, porque ele era perfeito desde o princípio: "Antes que Abraão existisse, disse ele, Eu sou" (Jo 8,58). Foi para poder, na sua bondade, dar a Abraão a vida eterna… Também no princípio, não foi porque tivesse necessidade do homem que Deus moldou Adão, mas para ter alguém para cumular com os seus benefícios.

Também não foi porque tivesse necessidade do nosso serviço que ele nos ordenou que o seguíssemos, mas para nos alcançar a salvação. Porque seguir o Salvador é tomar parte na salvação, tal como seguir a luz é tomar parte na luz. Quando os homens estão na luz, não são eles que iluminam a luz e a fazem resplandecer, antes são iluminados e tornados resplandecentes por ela… Deus concede os seus benefícios aos que o servem porque o servem e aos que o seguem porque o seguem; mas não recebe deles nenhum benefício, porque é perfeito e não precisa de nada.

Pão para a Alma

Fonte

Tradução de Felipe Ortiz

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Ora, Ele que O ressuscitou dos mortos ressuscitará também a nós, desde que façamos a Sua vontade, adotemos Seus mandamentos como nossa regra de vida e amemos o que Ele ama; se nos abstivermos de todo tipo de transgressão, avareza, amor ao dinheiro, calúnia e falso testemunho; se não retribuirmos o mal com o mal, ofensa com ofensa, golpe com golpe, maldição com maldição; mas, ao contrário, tivermos em mente o que o Senhor ensinou quando disse: "Não julgueis, para que não sejais julgados".

São Policarpo
, "Epístola aos Filipenses".

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"As aves do céu não semeiam, nem segam." Deus lhes permitiu tomar de tudo e comer livremente. Como um homem injusto e mau que olha injustamente para as coisas dos outros, elas comem o que não lhes pertence. Foi-nos escrito que nós prestássemos atenção a elas para que compreendêssemos todas as parábolas e tivéssemos conhecimento; não para que nós mesmos nos tornássemos ladrões também, mas que em vez disso caminhássemos pela via dos justos dos tempos antigos, que eram agradáveis a Deus.

Das "Cartas" de São Pacômio ("Pafchomian Koinoina", vol. 3)

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Então, para que possamos saber o tamanho da distância à qual Ele o deslocou do jardim, a Sagrada Escritura nos esclarece esse fato adicional com as palavras: "O Senhor Deus lançou fora Adão e o pôs defronte ao jardim das delícias." Notem como cada um dos eventos provou ser uma ocasião de benevolência da parte do Senhor comum de todos, e como cada exemplo de castigo transborda de bondade. Quero dizer que a expulsão não foi o único sinal de amor e de bondade; também o foi sua localização defronte ao jardim, de modo que ele pudesse ter uma interminável angústia ao relembrar de que alturas ele caíra, e que se precipitara em tamanhas profundezas. Contudo, mesmo que a sua vista fosse causa de uma dor insuportável, ela entretanto foi ocasião de não pouco benefício: a vista constante provou ser para esse homem aflito um estímulo à cautela no futuro, a fim de que ele não incorresse de novo no mesmo pecado.

São João Crisóstomo, "Homilias Sobre o Gênesis", Vol. II

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É muito comum que vejamos viajantes que não se desviam do caminho certo mesmo que haja várias curvas; eles evitam as outras estradas uma vez que tenham sido advertidas sobre elas. Quanto mais uma pessoa se mantiver à distância dos caminhos errados em sua jornada, tanto mais ela perseverará no caminho certo. Assim, também a mente começará a ter consciência do verdadeiro sentido da realidade se ela evitar as coisas banais.

São Gregório de Nissa, "Da Glória à Glória".

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Orações pelo perdão dos pecados são mais eficazes quando acompanhadas de esmolas e jejum, e súplicas elevadas por tais auxílios sobem rapidamente aos ouvidos de Deus. Pois está escrito: "o homem misericordioso faz bem à sua própria alma" (Prov. 11:17), e nada é tão próprio de um homem quanto aquilo que ele gasta com seu próximo. Pois aquela parte de suas posses materiais com que ele atende os necessitados é transformada em riquezas eternas.

Dos "Sermões" de São Leão o Grande.
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Refrear o estômago torna o coração humilde; agradar o estômago torna o espírito orgulhoso.

São João Clímaco, "A Escada da Ascensão Divina".
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Aquele que conseguiu obter as virtudes e se enriqueceu de sabedoria espiritual vê as coisas claramente em sua verdadeira natureza. Conseqüentemente, acerca de todas as coisas ele tanto age quanto fala de um modo apropriado e nunca se encontra iludido. Pois é de acordo com o nosso uso certo ou errado das coisas que nós nos tornamos bons ou maus.

São Máximo, o Confessor, "Primeira Centúria sobre o Amor", na "Filocalia", vol. II.

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Que tribulação não suportarias para encontrar alguém que orasse por ti ao Senhor? Eis aqui quarenta, orando a uma só voz. Onde dois ou três estão reunidos em nome do Senhor, Ele está no meio deles. Quem duvida de Sua presença no meio de quarenta? O aflito debanda para os Quarenta, o jubiloso corre para eles; o primeiro em busca de alívio para suas tribulações, o último para a preservação de suas bênçãos.

São Basílio o Grande, "Homilia sobre os Quarenta Soldados Mártires de Sebaste".

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Aqueles que renunciaram a seus vícios precisam ainda buscar as virtudes que os farão crescer. Depois de dizer: "aqueles que vêm após Mim, neguem-se a si mesmos", o Senhor imediatamente acrescenta: "tomem cada dia a sua cruz, e sigam-Me". Há duas maneiras pelas quais podemos tomar a nossa cruz. Podemos abalar nossos corpos através da abstinência, e podemos afligir nossos corações através da compaixão pelo próximo.

São Gregório o Grande, "Sede Amigos de Deus".

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A mansidão é o arrimo da paciência, a porta -- ou antes, a mãe -- do amor, e a base do discernimento, pois está dito: "O Senhor ensinará aos mansos os Seus caminhos" (Salmo 24:9). Ela nos prepara para o perdão dos pecados; ela é a ousadia na oração, uma morada do Espírito Santo.

São João Clímaco, "Escada da Ascensão Divina".

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Ora, essas Escrituras divinamente inspiradas nos ensinam, tanto as do Velho quanto as do Novo Testamento. Pois o Deus dos dois Testamentos é um só, que no Velho Testamento predisse o Cristo que apareceu no Novo; e que pela Lei e pelos Profetas nos levou à escola do Cristo. "Pois antes que a Fé viesse, estávamos guardados debaixo da Lei", e "a Lei nos serviu de aio para nos conduzir ao Cristo".

São Cirilo de Jerusalém, "Instruções Catequéticas" (IV).

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Tal como um casamento e um funeral são exatamente o oposto um do outro, assim também são o orgulho e o desespero. Mas, como resultado da confusão causada pelos demônios, é possível ver os dois juntos.

São João Clímaco
, "A Escada da Ascensão Divina".

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Há as montanhas de especiarias: aqueles que recebem o Corpo do Senhor Jesus e o envolvem em lençóis com especiarias. Pois é na crença de que Jesus morreu, foi sepultado e ressuscitou que está o auge da verdadeira fé, alcançado pela mais excelente das virtudes. Portanto, onde é que se procura o Cristo? Indubitavelmente, é no coração de um Bispo prudente.

Santo Ambrósio de Milão, "Da Virgindade".
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O poder do Altíssimo então encobriu com Sua sombra aquela que não conhecia matrimônio, para que ela pudesse conceber, e proclamou seu ventre frutífero como um prado ameno para todos os que desejam colher a salvação, enquanto cantam: aleluia!

Do Hino Acatisto à Santíssima Mãe de Deus.

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Uma alma dócil guarda palavras de sabedoria, pois o Senhor guiará o manso em seu juízo - ou melhor, em seu entendimento.

São João Clímaco, "A Escada da Ascensão Divina".

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Assim, uma mulher que outrora havia sido lasciva e culpada de sensualidade (um pecado difícil de apagar) não se perdeu do caminho da salvação: pois ela buscou refúgio Naquele que sabe como salvar e que é capaz de erguer o homem dos abismos da impureza. Ela, portanto, não fracassou em seu intento. Mas o tolo fariseu -- conta-nos o bendito Evangelista -- se escandalizou.

São Cirilo de Alexandria, "Comentário ao Evangelho de São Lucas".